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Artigo da ANDECC
Associação questiona "Trem da Alegria dos Cartórios"

Renomado advogado SEPÚLVEDA PERTENCE ataca Concurso Público para beneficiar Interinos de Cartórios

Uma famosa atriz estrela de novela global, ao fazer um comercial de um sabonete fétido, conseguiria convencer os seus fãs a adquirir aquele produto apenas porque fechou um ótimo contrato de publicidade para si?

O nome de um grande jurista seria o suficiente para fazer o Judiciário solapar os mais comezinhos valores republicanos da nossa Constituição?

É esse questionamento, no âmbito do Judiciário, que está prestes a ser respondido pelo STF-Supremo Tribunal Federal e CNJ-Conselho Nacional de Justiça.

O valor republicano em perigo é o que propala que cargos, funções e serviços públicos são acessíveis por qualquer um do povo, após a devida seleção por concurso público ou licitação (isto é, uma aferição objetiva e isonômica).

Em razão de intensa batalha travada pelo CNJ desde 2007, felizmente está caindo por terra a  deplorável ideia de que cartórios extrajudiciais seriam feudos de propriedade privada familiar passados a apaniguados privilegiados como herança de geração em geração.

Mas em que pese todo esse louvável esforço do bravo CNJ, os antigos apaniguados de Goiás ainda resistem ferozmente contra a aplicação da Constituição.  Esses interinos, não satisfeitos com todo o longo tempo que já irregularmente se beneficiaram de suas imorais e inconstitucionais nomeações, não cansam de usar de todas as artimanhas processuais e políticas para ir tentando se manter o máximo possível de tempo à frente daquilo que consideram como suas “propriedades”.

Em 2005 combinaram com seu parceiro deputado goiano João Campos para que esse encampasse a propositura da famigerada Emenda Constitucional 471, imoralidade que ficou conhecida como “Trem da Alegria dos Cartórios” e foi apelidada de “gambiarra jurídica” pelo Ministro Gilmar Mendes, causando rejeição pública do meio jurídico, pois objetiva pisotear a ordem constitucional de que a titularidade de cartórios extrajudiciais só pode ser delegada a particulares por meio de concurso público[1].

E como defensor do Trem da Alegria, os interinos não economizaram esforços e contrataram em 2005 um jurista de peso: o ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence[2]. Mas até hoje felizmente não conseguiram aprovar esta aberração que criaria uma usucapião de serviço público, provando que ainda há um mínimo de dignidade no Congresso Nacional.

Agora os interinos miram esse grande jurista contra o Concurso Público de Cartórios de Goiás, iniciado em 2008 e até hoje, quase seis anos depois, não encerrado.

Em 2011, quando tal concurso caminhava para o seu final, os interinos conseguiram uma liminar suspendendo o concurso, dada pelo então desembargador goiano João Ubaldo Ferreira após cinco dias do ajuizamento da ação[3].

Como se não bastasse estar tal desembargador usurpando a competência do STF, e acatando absolutamente todas as sofríveis alegações dos interinos, havia ainda um detalhe que chamava a atenção para a estranha decisão: o filho deste desembargador, João Ubaldo Ferreira Filho, era nada menos que o advogado dos interinos em diversos outros processos.

O filho do ilustre desembargador já promovia ações de interinos goianos contra tal concurso perante o próprio o TJGO, perante o CNJ e perante o STF. Exemplos desses processos: no TJGO: ns. 312539-21.2008.8.09.0000 (200803125393) e 413228-5.2010.8.09.0000 (201094132284); no CNJ: PP 38441, no qual se publicou a lista geral de vacâncias de todo país); e perante o STF: mandados de segurança ns. 27.297, 29.936 e 29.932.

Enquanto o filho atacava o concurso judicialmente, o próprio desembargador João Ubaldo o atacava administrativamente, antes de sua homologação.

É que, ironicamente, na época da homologação do concurso, o desembargador João Ubaldo Ferreira era nada menos que o presidente da Comissão de Seleção e Treinamento do TJGO, a qual era a responsável por dar andamento ao concurso iniciado em 2008. E neste posto – como presidente da referida Comissão – intentou anular administrativamente o concurso, ao tentar convencer os demais desembargadores integrantes da comissão de que o certame estava viciado. No entanto não obteve êxito sendo o concurso homologado pela referida comissão[4].

Para apurar essa evidente imoralidade o CNJ instaurou Reclamação Disciplinar contra o douto desembargador, mas esse logo depois se aposentou, razão pela qual o CNJ determinou o seu arquivamento. Assim, o desembargador João Ubaldo escapou da atuação do órgão censor porque se aposentou poucos meses após emitir decisão viciada por odiosa suspeição e carregada de teratologia jurídica (teratologia em razão dos sofríveis argumentos acolhidos para suspender o concurso e manter por mais tempo, assim, interinos com seus feudos goianos).

Após isso, o CNJ interveio nos autos e o relator superveniente de tal processo considerou-se incompetente e o remeteu ao STF.

A estranha decisão do des. Ubaldo nunca foi sequer cumprida pelo TJGO, tendo em vista sua esdrúxula antijuridicidade. O desembargador que o sucedeu, ao se dar por incompetente, implicitamente considerou os atos decisórios pretéritos sem efeito, conforme dispõe o Código de Processo Civil (art. 113, parágrafo 2o) e ampla jurisprudência[5].

Mas em 3.3.2011 o concurso foi realmente suspenso por decisão do STF em processo que discutia apenas a valoração de títulos. Isso foi resolvido em dezembro de 2013, quando o STF e o CNJ determinaram que fosse o concurso finalmente finalizado.

A sessão de escolha das serventias pelos candidatos, e outorga, foi finalmente designada para 2.4.2014 (quase 6 anos após o início do concurso).

E é aqui que entram os interinos com a sua derradeira arma: contrataram mais uma vez o ex-ministro Sepúlveda Pertence para tentar reavivar aquela esdrúxula liminar do desembargador João Ubaldo para, mais uma vez, atravancar o concurso. Tentam, após mais de seis anos do seu início, impedir novamente a finalização do certame e possibilitar a eternização da prática feudal cartorial no Estado de Goiás.

Assim, o advogado e ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence intentou em 11.3.2014 o Pedido de Providências n. 0001698-80.2014.2.00.0000, por meio do qual pede que o certame seja suspenso por força daquela falecida e esdrúxula liminar deferida por um desembargador suspeito que, logo após decidir, aposentou-se e se livrou da atuação do órgão censório.

Sabe-se que até o mais terrível criminoso tem o direito de ser defendido por advogado.

Não se critica, portanto, o notável ex-ministro pela defesa de tão nefasto ideal anti-republicano (manutenção da feição hereditária das titularidades de cartório extrajudicial), pois está apenas exercendo a sua profissão conforme acordo laboral acertado.

O que chama a atenção é o fato de que agora veremos como se comporta o Judiciário, notadamente o CNJ e STF, quando se depara com um pleito direcionado a um objetivo tão vergonhoso quanto esse, mas, por outro lado, assinado por um antigo e respeitado amigo.

Veremos nos próximos capítulos se a contratação do peso do nome de um jurista, e sua proximidade dos julgadores, sobrepuja a lógica jurídica republicana da nossa Constituição Cidadã.

A ANDECC, os quase 200 candidatos aprovados, o meio jurídico e a sociedade em geral aguardam com atenção a resposta a esta pergunta.

Fonte: ANDECC