Será conhecido no dia 4 de dezembro o novo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. Com o atual ocupante do cargo, desembargador Ivan Sartori, tendo sua candidatura à reeleição vedada após decisão do Conselho Nacional de Justiça, quatro integrantes da corte fizeram sua inscrição até 14 de novembro, data limite para a manifestação dos interessados. Assim, disputarão a eleição os desembargadores João Carlos Saletti; José Renato Nalini, atual corregedor-geral da Justiça; Paulo Dimas de Bellis Mascaretti; e Vanderci Álvares.
A revista Consultor Jurídico enviou as mesmas perguntas aos quatro candidatos no dia 14 de novembro. Até a publicação deste texto, o desembargador Vanderci Álvares não retornou o contato com suas respostas.
Leia as respostas dos desembargadores João Carlos Saletti, José Renato Nalini e Paulo Dimas de Bellis Mascaretti.
ConJur — Qual é sua plataforma de campanha?
João Carlos Saletti — O Regimento Interno do tribunal atribui ao presidente a prática dos atos da administração superior da corte, cotando com a participação de nove comissões, das quais destaco as de Organização Judiciária, Assuntos Administrativos e de Orçamento, Planejamento e Finanças, que tocam diretamente à administração superior do tribunal. Dentre as atribuições da comissão de Assuntos Administrativos está o plano plurianual de gestão, suas alterações e relatórios semestrais de execução.
Esse plano, de sua vez, atrela-se à Lei de Diretrizes Orçamentárias (cuja formação e definição devem influenciar ano a ano) e a execução da lei orçamentária anual, a tornar compatíveis estratégias e metas e o atendimento das prioridades (como a instalação de varas e cartórios, por exemplo) com a disponibilidade de recursos.
A questão orçamentária inclui o cumprimento de obrigações de caráter puramente administrativo, ligadas às despesas de custeio e investimento, e as de caráter eminentemente funcional, para os servidores e para os juízes, tocante aos de vencimentos e subsídios, e também a indenizações devidas a todos, pelos mais variados motivos. O tribunal, em que pese o notável esforço da gestão atual, ainda enfrenta passivo neste campo. Esse objetivo é de caráter permanente.
Nesse passo, intento proceder — como fiz quando vice-presidente e presidente do 2º Tribunal de Alçada — ao entendimento com o governador e seus secretários e assim também com o poder Legislativo, fazendo ver de que realmente necessita o poder Judiciário para dar cabo de todos os seus compromissos, seja no campo funcional, seja no campo de atendimento das despesas de investimento — indispensáveis para o desenvolvimento material e tecnológico do Tribunal, de algum modo atendidas pelo Fundo Especial de Despesas — e despesas de custeio do funcionamento dos órgãos do tribunal — mais de 3 mil juízes e perto de 50 mil servidores, além da folha de aposentados —, e mais de 600 prédios espalhados por todo o estado. Essa estrutura, que é indispensável e que não comporta redução, senão desenvolvimento, reclama recursos financeiros de grande envergadura. E procurar retomar o percentual de 6% da receita corrente líquida do estado, a que alude a Lei de Responsabilidade Fiscal, necessários a fazer frente às despesas com pessoal (servidores e juízes). Esse percentual, que chegou a mais de 7% antes da edição da lei em 2001, foi a esta ajustado, mas viu-se reduzido ao longo dos anos, chegando perto de 4%, sendo essa uma das causas de insuficiência orçamentária nesse campo.
Por outro lado, se o tribunal deu início à especialização da secretaria, dividindo-a por áreas de atuação, hoje, os mesmos serviços são também regionalizados. A continuidade de ações positivas da atual gestão, que procurou restabelecer a autoestima dos servidores, não só com ações que a eles interessam direta e pessoalmente e às suas famílias, como a questão remuneratória, mas também com a melhoria das condições de trabalho, continuidade do processo de informatização iniciado há alguns anos, a digitalização dos processos e dos métodos de trabalho, incluindo a capacitação funcional e a busca da melhoria de instalações forenses em todos os sentidos. O plano de reestruturação e modernização do poder Judiciário é imprescindível tendo como objetivo maior alcançar a eficiência do sistema.
Esse assunto interessou-me diretamente por ter-me envolvido com o desenvolvimento desse projeto por cerca de três anos, naquele período, quando instalada a especialização das secretarias, por exemplo, e inoculada no seio do funcionalismo a ideia da necessidade de alteração da metodologia e dos processos de trabalho. Nesse aspecto, quero dar ênfase à profissionalização das secretarias — que são órgãos permanentes, enquanto o exercício dos órgãos diretivos superiores, é transitório — buscando o aprimoramento técnico e intelectual dos serviços, de cuja atuação toda a administração depende.
Outra questão a enfrentar é a recuperação dos quadros funcionais, há muito defasados pela evasão de servidores e pelas aposentadorias, isso associado ao crescimento do número de órgãos judiciários (varas e cartórios em todo o estado) e do implemento de assessorias em segundo grau, na capital. Não esqueço da construção do edifício anexo ao tribunal, pelo qual a gestão atual vem lutando, como as anteriores, e ao que se informa, prestes a iniciar-se. Destina-se especialmente aos cartórios de 2ª instância e aos gabinetes de trabalho dos desembargadores e juízes substitutos de 2ª instância e auxiliares.
A importância desse antigo projeto do tribunal é notória. Reunirá num só lugar os trabalhos de 2ª instância, resolvendo o velho problema de funcionarem as sessões de julgamento, os gabinetes de trabalho e os cartórios em prédios diferentes e, hoje, distantes entre si. Isso tem elevado custo financeiro, de logística, de tempo de movimentação dos juízes, funcionários, autos e papéis. O que pretendo é dar cumprimento a esses desígnios — que são do poder Judiciário — contando com a participação e a colaboração dos desembargadores e juízes de todo o estado, hoje chamados a administrar regionalmente, como longa manus da presidência.
José Renato Nalini — Tive o privilégio de participar de uma gestão exitosa, que foi a capitaneada pelo desembargador Ivan Sartori. Na condição de corregedor-geral da Justiça, integrei o Conselho Superior da Magistratura e o Órgão Especial. Tenho um diagnóstico bastante preciso da situação do poder Judiciário em São Paulo. Acrescento a isso a experiência da vice-presidência e presidência do extinto Tribunal de Alçada Criminal, que foi o melhor tribunal em termos de administração, onde a gestão foi participativa. Magistrados e servidores estavam irmanados e felizes. O que resultou em uma prestação jurisdicional paradigmática. Basta indagar a quem testemunhou esse fenômeno. Pretendo, com a participação efetiva dos colegas e colaboração dos servidores e parceiros, continuar o dinamismo inaugurado em 2012/2013 e abrir novas frentes para tornar o ambiente interno ainda mais saudável e satisfeito, para que o destinatário da prestação jurisdicional também possa contar com uma Justiça operosa, eficiente, célere e segura.
Paulo Dimas — A nossa campanha prega, essencialmente, a necessidade de continuar investindo na modernização do poder Judiciário, de modo a aprimorar a administração da Justiça. Os avanços almejados passam por uma política de qualificação permanente dos recursos humanos envolvidos no serviço judiciário, tendo lugar, à evidência, a valorização de nossos magistrados e servidores, com a disponibilização da necessária estrutura para o bom desempenho de suas atividades e o respeito a seus direitos funcionais; nessa linha, devemos atingir os objetivos traçados no planejamento estratégico em vigor, quais sejam, uniformização e melhor gerenciamento das rotinas de trabalho nos ofícios judiciais físicos, o aprimoramento do sistema de informatização das unidades judiciais e administrativas, a ampliação das varas digitais, a capacitação permanente dos servidores, a comunicação social e a adequação de nossos prédios às necessidades atuais para melhor atendimento da população.
ConJur — É a favor da especialização de varas?
João Carlos Saletti — Acabei de falar sobre a especialização administrativa. A especialização é tendência moderna, em todas as áreas de atuação humana, salientando-se a medicina e a engenharia. A aplicação do Direito não foge à regra já estabelecida. Há advogados criminalistas, cíveis, tributaristas, etc.
Há muitos anos, as varas de São Paulo são especializadas, como todos sabem. Os tribunais de slçada também o foram. O Tribunal de Justiça aproveitou muito dos ensinamentos daquelas cortes. A especialização possibilita o domínio da ciência e da técnica da respectiva área, o que leva à melhoria da qualidade do serviço judiciário e jurisdicional e, como reflexo, permite maior produtividade numérica, alcançando eficiência na prestação do serviço público.
José Renato Nalini — Sou favorável. A especialização permite o consenso possível na obtenção de jurisprudência mais estável e, portanto, mais apta a conferir segurança jurídica nas relações sociais. Vive-se uma era de intensa judicialização e se o poder Judiciário puder orientar a sociedade para as teses predominantes, poderá contribuir para uma certa contenção de lides temerárias. Um volume administrável de lides permitirá uma prestação jurisdicional mais célere. Todos ganharão com isso. Depois, as experiências nessa área que o TJ-SP iniciou há muitas décadas são exitosas: Cíveis e Criminais, varas de Família, da Infância e Juventude, da Fazenda Púbica, de Registros Públicos, etc. Na segunda instância também os projetos deram certo: Câmaras Empresariais, Câmaras reservadas ao Meio Ambiente. Por que não prosseguir nessa linha?
Paulo Dimas — A especialização das varas já é uma realidade em todas as comarcas de maior porte, incluindo a capital. Importa salientar que foram criadas dez regiões judiciárias no estado, englobando diversas circunscrições, e a meta é instalar então varas regionais especializadas, como, por exemplo, as de Execução Fiscal Estadual. Também deverão ser instalados departamentos digitais regionais de execução penal e de inquéritos policiais. Essa especialização pode representar maior agilidade nos julgamentos e economia de recursos humanos e financeiros.
ConJur — É a favor de mais súmulas de tribunais de segunda instância?
João Carlos Saletti — Todos sabemos que, em matéria de interpretação do direito constitucional e infraconstitucional, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça dão a última palavra, na forma da Constituição. Apesar disso, a edição de súmulas pelos tribunais locais é de extrema importância para a orientação dos próprios desembargadores, juízes e advogados.
Somente são editadas quando consolidado o pensamento do tribunal após a repetição de julgados por suas diversas câmaras. Além disso, ante a necessidade de aumento da produtividade, a invocação de súmulas, para dar solução aos diversos casos em que sejam incidentes, abrevia o desenvolvimento de razões, tomando menos tempo dos desembargadores e juízes na preparação de acórdãos e sentenças.
Essa experiência vivenciamos no 2º Tribunal de Alçada Civil, de cujo Centro de Estudos tive a alegria de ser diretor. Do Centro de Estudos partiu a ideia de editar enunciados orientadores, especialmente após a edição da Lei 8.245/91. Esses enunciados, mais adiante, foram transformados em súmulas. Hoje, no Tribunal de Justiça, as súmulas são aprovadas e editadas pelo Órgão Especial, vindo a inciativa, por exemplo, por intermédio das Turmas Especiais das diversas Seções, sem prejuízo de outros mecanismos como o previsto no artigo 252 do Regimento Interno.
José Renato Nalini — As súmulas refletem a orientação predominante sobre temas repetitivos. Elas servem de orientação para o usuário do sistema judicial. Elas são úteis, desde que não sejam blindadas, a impedir sua periódica reavaliação e revisão. Pois a realidade social é muito mais exuberante do que a restrita capacidade de previsão dos elaboradores tanto das leis, como da doutrina, como da jurisprudência.
Paulo Dimas — As Turmas Especiais atuando nas três seções do Tribunal já vêm se empenhando na tarefa de uniformizar a jurisprudência da Corte, com a edição frequente de súmulas. À evidência, a jurisprudência assim consolidada também representa maior agilidade nos julgamentos, em prestígio ainda da segurança jurídica.
ConJur — O que propõe a respeito do processo eletrônico?
João Carlos Saletti — O processo eletrônico está definido e regulado por lei federal. Sua implementação prática depende unicamente do aparelhamento do tribunal, de sua secretaria, e das varas e cartórios, não só com equipamentos de informática, mas também com os programas adequados e, sobretudo, com o treinamento dos servidores. O mesmo é exigido dos advogados e dos membros do Ministério Público.
Representa meta inadiável do poder Judiciário, por medida não só de eficiência do processo (com o desaparecimento dos chamados tempos mortos no andamento dos autos), mas também de economia e conservação do próprio acervo de feitos a arquivar. É incalculável a importância gasta com a manutenção de espaço físico dos processos antigos desde a fundação do tribunal.
Não vejo, de imediato, o que propor de novo, senão a continuidade dessa implementação, que é gradativa — como não pode deixar de ser — mas constante. Sou entusiasta da inovação, que representa uma conquista de nossa época e da sociedade a quem devemos servir.
José Renato Nalini — Ele é irreversível. Mas por pertencer a uma esfera do conhecimento em que a mutação é a regra, onde a única certeza parece residir na incerteza, precisa de um permanente acompanhamento e flexibilidade para correções de rumo, vocação de adaptabilidade ao novo e a não resistir à obsolescência, signo inafastável desse domínio. Ele demandará mudança de cultura, a partir da educação fundamental e da universidade. Mas poderá mostrar que a informatização e mesmo a cibernética são instrumentos de efetivação do justo, não modismos passageiros. O processo eletrônico marca a confluência do Judiciário com o ritmo do mundo contemporâneo, que já não pode se submeter ao tempo da Justiça. Vamos continuar a investir nele e a corrigir suas inadequações. Nessa rota não há retorno!
Paulo Dimas — O processo eletrônico se encontra regulamentado na Lei Federal nº 11.419/2006. A sua implementação em todas as varas e no âmbito dos tribunais depende da disponibilização de recursos técnicos e financeiros, envolvendo então o aprimoramento da tecnologia existente e disponibilidade orçamentária. O planejamento estratégico do TJ-SP em vigor prevê para 2014 a ampliação das varas digitais; na atualidade, cerca de 40% das varas das diversas comarcas do estado já operam com processos digitais. O processo digital também já foi implantado em segunda instância, notadamente para os feitos de competência originária do Tribunal de Justiça.
ConJur — Qual é o modelo mais eficiente para o pagamento de precatórios?
João Carlos Saletti — O sistema constitucional tradicional, na essência, não é ruim, na medida em que pagamentos de dívidas da União, dos estados e municípios e do Distrito Federal, dependem de dotações orçamentárias, pois somente o Executivo sabe quanto pode gastar.
O que ocorre, no meu modo de ver, não está no sistema, mas na incapacidade do Estado brasileiro de assumir obrigações nos limites orçamentários e de pagar tudo que deve. Desapropriações, por exemplo, devem ser pagas previamente, diz a Constituição. Há muitos anos não o são, enquanto o Estado brasileiro, nas suas três esferas, continua a comprometer os orçamentos futuros.
O volume da dívida só aumenta, com a somatória de correção monetária e juros. A decisão, nesse campo, é menos jurídica, mais política, no meu modo de ver, embora algumas providências já sejam desenvolvidas pelo tribunal, com o atendimento judicial e a antecipação de pagamentos nos casos humanitários. Por outro lado, credores podem alcançar a satisfação de seus créditos com a cessão deles, com lamentável deságio negociado no mercado, se não se dispuser a aguardar o pagamento, apesar de eu pessoalmente ser contrário a essa modalidade de negociação pelos prejuízos suportados pelo credor.
José Renato Nalini — O modelo ideal seria a efetiva satisfação do crédito assim que houvesse trânsito em julgado. Na impossibilidade, pois há débitos acumulados por várias administrações, precisamos encontrar juntos uma fórmula de satisfazer todos os interesses. O problema é complexo, porque os interesses dos devedores encontram eco no Parlamento, que modifica a Constituição para contínuas moratórias. É urgente repensar tudo isso e verificar se as competências conferidas ao Judiciário permitem ao tribunal uma atuação mais efetiva nessa área.
ConJur — É a favor da conciliação em cartório?
João Carlos Saletti — A pergunta não esclarece em que cartório. No tabelião, por exemplo? Partes maiores capazes podem negociar e por fim a seus conflitos por várias maneiras e meios, particularmente ou com a intervenção de alguém que as assista e oriente. Nesse campo atuam os advogados e as defensorias, e também o Ministério Público, nas áreas de sua intervenção. Quer-me parecer não ser vocação do tabelião a condução de processos de conciliação. Como se sabe, tem reservada tarefa de alta responsabilidade, consistente no registro da vontade de partes e interessados, orientando-as apenas quanto ao cumprimento de formalidades legais e tributárias, necessárias ao aprimoramento de escrituras de compra e venda, para tomar um exemplo dos atos que praticam.
O tribunal possibilita mais que isso, porque o acordo a que chegarem as partes contará com a homologação do juiz, e pode ser executado, se for o caso, pelo regime de cumprimento da sentença, o que garante mais segurança para as partes. No âmbito do tribunal, os interessados são ouvidos por um desembargador, geralmente aposentado, ou por conciliadores de confiança, gratuitamente.
Por outro lado, e assim também ocorre na 1ª instância, conta com a equidistância e imparcialidade do conciliador, leigo ou judicial, como hoje sucede, nos mecanismos postos à disposição das partes praticamente em todo o Estado. Assim porque, como dito, conta com a orientação e o suporte dos Juízes.
O sistema, penso, poderia avançar com a conciliação pré-processual, a evitar o desgaste das partes, sucedido após o ajuizamento da ação, além do barateamento do processo para elas. Aí, penso, o Judiciário, valendo-se dos mesmos mecanismos de conciliação existentes, poderá auxiliar o Estado a concretizar a assistência jurídica integral de que fala a Constituição, o que é mais que a assistência judiciária.
Existe também a arbitragem, que confere às empresas a escolha de um árbitro para solução de seus conflitos e essa metodologia ganha espaço, apenas vindo a juízo em hipóteses de irregularidades formais. É meio alternativo de distribuição da justiça, à disposição das partes, nos casos previstos em lei.
José Renato Nalini — Sim. Tanto que editei o Provimento 17/2013, instaurando aquilo que as serventias extrajudiciais já fazem por dever de ofício. Um dos deveres do notário é justamente formalizar a vontade da parte. Se a vontade do cidadão for lavrar uma escritura de conciliação com seu adverso, é evidente que o tabelião não pode se recusar a tanto. A Corregedoria prestigiou e incentivou iniciativas conciliatórias quais a OAB concilia, por exemplo. Todos os métodos alternativos são importantes para reduzir a exagerada carga de processos entregues ao Judiciário, muitos deles suscetíveis de uma solução mediante diálogo ou saudável debate entre os interessados, que podem ser assistidos por advogados. Aliás, é assim que se prepara a cidadania para o protagonismo dela exigido ante a promessa de uma Democracia Participativa no texto constitucional de 1988.
ConJur — Como fazer para o tribunal julgar mais e melhor?
João Carlos Saletti — Pouco atrás aludi às súmulas. Produzir mais reclama assistência jurídica aos desembargadores. O tribunal conta com a valiosíssima colaboração dos assistentes jurídicos. Esses servidores precisam ser treinados, não só pelo desembargador, mas também pelo tribunal, com a realização de cursos e seminários, na escola de servidores ou mesmo na Escola da Magistratura, que conta com estrutura material e funcional para isso, produzindo bons resultados.
A organização dos gabinetes, a escolha e reunião de processos por temas específicos — quando isso é possível — e a possibilidade de o desembargador dar cabo de conhecer o caso e formar convicção pessoal é outra maneira de agilizar os julgamentos. Os julgamentos, como disse o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, “devem ter um conteúdo que dê resposta real à sociedade. É assim que manteremos a credibilidade da Justiça”. Essa — a de cultivar e de preservar a qualidade do serviço judiciário — é meta-alvo também do nosso Tribunal de Justiça e cumprindo-a não estaremos fazendo favor a ninguém.
José Renato Nalini — O tribunal está atuando no limite de suas forças. Para conferir ainda maior eficiência a seus serviços, precisamos ouvir os magistrados. Verificar se convém a realização de julgamentos temáticos, assim como já se faz nos tribunais superiores. Se a adoção do processo eletrônico vai acelerar a prestação jurisdicional. Estimular iniciativas partidas de quem está na trincheira e sente a angústia de uma exigência cada vez mais intensificada de produzir mais e melhor e sabe que a decisão deve ser o fruto de uma reflexão madura, nem sempre conciliável com a pressa. O poder Judiciário tem o dever de propiciar a seus integrantes a estrutura e as condições ideais para que a produtividade seja aquela esperada. Não é outro o propósito de todos os integrantes do grande sistema Justiça.
Paulo Dimas — A grande deficiência do nosso tribunal não diz respeito aos seus recursos humanos, mas aos recursos materiais disponíveis, comprometendo uma maior produtividade. No entanto, existem avanços a serem registrados, a partir da recomposição do quadro funcional (foram nomeados aproximadamente 4 mil novos servidores no último biênio) e de sua capacitação, bem como dos expressivos investimentos em informatização. No período de janeiro a outubro de 2013, por exemplo, entraram 614,4 mil novos feitos no TJ, sendo julgados, porém, 696,3 mil, ou seja, o número de julgamentos superou o de processos que deram entrada na corte nesse período, o que evidencia o aumento de produtividade, a partir do empenho de magistrados e servidores, bem como da melhor estrutura organizacional implementada.
ConJur — O que acha da ideia de executar a decisão já depois da decisão de segunda instância, como quer a PEC dos recursos?
João Carlos Saletti — Hoje, já é possível executar provisoriamente as decisões de 2ª instância, das quais não mais caiba recurso com efeito suspensivo de sua eficácia. Mas, com limitações impostas pela lei — não se faz pagamento em dinheiro, nem se aliena o patrimônio do devedor, sem caução, como medida acauteladora da parte vencida, também merecedora de Justiça. A proposta que admite execução em caráter definitivo é controvertida, cria eventual irreversibilidade da execução, sem garantia, pois o que foi objeto de execução, muitas vezes, já não se poderá reverter.
Mas hoje, com o mecanismo da antecipação dos efeitos da tutela de mérito, sabemos que muitas medidas deferidas pelos juízes e confirmadas pelos tribunais assumem esse caráter, como as que deferem a execução de providências práticas, como cirurgias na área da saúde. A irreversibilidade nesses casos se resolve em perdas e danos, com a responsabilidade patrimonial do beneficiado pela antecipação, acaso perca a demanda. Não pode ser diferente. E essa solução pode resultar na irreversibilidade prática, à falta desse patrimônio, portanto. A execução como regra, como vem proposta pela PEC, deve ser examinada com prudência, diante da falibilidade humana.
Levada essa ideia para o campo da decisão final, já com cognição exauriente, pelo tribunal de 2ª instância, a solução será a mesma, agora com suporte num processo de revisão por órgão colegiado. A efetividade da Justiça está assentada no comando das sentenças e acórdãos, sem a espera do esgotamento de todos os recursos possíveis, na própria esfera de 2ª instância.
Ou seja, o trânsito em julgado já não constituirá exigência para que essa consecução seja alcançada, sem a possibilidade de dano irreversível. O devedor obrigado a cumprir a decisão, forçadamente, terá de se valer de mecanismo inverso, pedindo a rescisão do acórdão do tribunal na instância superior. E, nesse caso, a via será estreita, porquanto ligada unicamente a eventual descumprimento de norma federal, de caráter constitucional ou infraconstitucional, como sucede hoje (é verdade), mas não mais pela via recursal.
José Renato Nalini — A magistratura é serva da lei, a começar do ápice do ordenamento: a Constituição. Se essa vier a ser a vontade comum, resultante do processo legislativo, principalmente com um quórum qualificadíssimo, que é o exigido para a reforma da Constituição, só restará ao Judiciário cumprir. Aparentemente, existe uma demanda de maior efetividade da Justiça, cujo acesso foi ampliado e que não conseguiu ainda administrar o seu acervo, diante de crescente procura pelo Judiciário.
ConJur — O que acha da criação de um departamento estadual de execuções penais, que centraliza todos os processos de execução na capital?
João Carlos Saletti — O tema não é simples. Parece-me implicar considerações de natureza administrativa, jurisdicional e política.
A centralização, em princípio, atenta contra a divisão do trabalho, e se afasta da regionalização administrativa à qual já me referi. Não sei dizer se a criação de grande departamento para cuidar de centenas de milhares de processos trará maior eficiência para o sistema, principalmente quando as Varas de Execuções do Estado são também responsáveis pela fiscalização das execuções da Justiça Federal, o que é bastante oneroso.
A ideia que está em curso por iniciativa do tribunal é a regionalização das execuções criminais, que deixam as pequenas comarcas para ir ter à sede da circunscrição regional, que conta com maior estrutura. Essa solução aprimora o sistema e põe sob maior segurança especialmente os Juízes de Direito.
José Renato Nalini — Iniciei minha jornada pela 2ª instância do Judiciário na Seção Criminal do Tribunal de Justiça, exatamente na 2ª Câmara Criminal do TJ, em 1990. Desde então, me preocupo com a situação das execuções criminais, estranhando que haja controle de estoque de automóveis, equipamentos eletrônicos, vinhos, livros, de tudo o que é material e não se tenha conseguido um controle eficaz de seres humanos a cumprir pena. Por isso, as execuções penais merecerão de minha parte a melhor e a mais acurada atenção. A centralização pode ser uma alternativa eficiente de otimizar a prestação jurisdicional durante a execução da pena.
ConJur — Pretende dar continuidade à política de reestruturação da organização do Judiciário?
João Carlos Saletti — A resposta é sim e não poderia ser outra. Disse, anteriormente, que já me envolvi com certa profundidade no assunto. Colaborei no funcionamento de Comitê de Gestão designado pela Presidência do Tribunal e formado por desembargadores — quatro — e juízes auxiliares da presidência, sem embargo do envolvimento e participação direta de mais de uma centena de servidores qualificados do tribunal (do antigo TJ e dos Alçadas). Na época, contamos com o auxílio de consultores da Fundação Getúlio Vargas, contratada pelo tribunal.
O objetivo, na ocasião, era trazer para o tribunal conhecimento técnico e científico indispensáveis à formulação de ideias que levassem à reestruturação procedida na época (a especialização das secretarias, por exemplo) e a introdução de novos mecanismos de gestão e de metodologia de trabalho. A profissionalização das secretarias e de seus servidores tem assento nas ideias então entregues ao tribunal em vários relatórios, que a administração da época e as seguintes poderiam seguir mesmo com as modificações e aprimoramentos necessários a cada passo.
José Renato Nalini — Tudo aquilo que a atual gestão, conduzida pelo desembargador Ivan Sartori, iniciou e implementou nessa área, merecerá continuidade. A Justiça de São Paulo é gigantesca, a maior do Brasil e uma das maiores do mundo. A intenção é prosseguir na trilha da atualização, da modernização, da adoção de tecnologias disponíveis e que já surtiram efeito em outros espaços públicos e contribuem para a eficiência da iniciativa privada. Tudo o que puder ser feito em termos de reestruturação e organização da Justiça se fará, com a colaboração dos quadros pessoais internos e dos parceiros externos. Por sinal, muitas entidades, como a Fundação Instituto de Pesquisa Econômica, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, a FGV, a USP, a Fiesp/Ciesp, a Febraban, Secovi, Secretaria da Reforma do Judiciário da Presidência da República e tantos outros, já foram acionados para a profunda reforma estrutural da Corregedoria Geral da Justiça neste biênio e continuarão parceiros na próxima administração. A Justiça não pode prescindir da colaboração de todos. É um serviço público essencial, uma prestação estatal que interessa à cidadania e é alicerce do Estado de Direito de índole democrática.
Fonte: Consultor Jurídico