O entendimento, proferido pelo TJ/RS, foi tomado como base pela 3ª turma do STJ para negar provimento a recurso que buscava impedir a percepção do sustento por parte de concubina com mais de 70 anos, em razão do fim da convivência.
O colegiado ponderou que a obrigação deveria ser mantida, sob pena de causar desamparo à idosa, “mormente quando o longo decurso do tempo afasta qualquer risco de desestruturação familiar para o prestador de alimentos“.
“Que dano ou prejuÃzo uma relação extraconjugal desfeita depois de mais de quarenta anos pode acarretar à famÃlia do recorrente? Que famÃlia, a esta altura, tem-se a preservar?“, questionou o relator do acórdão, ministro João Otávio de Noronha.
Relacionamento amoroso
No caso, as partes mantiveram um relacionamento paralelo ao casamento do réu por cerca de quatro décadas. A mulher abandonou sua atividade profissional em 1961, passando a viver às expensas do homem que, inclusive, assinou sua CTPS para fins previdenciários. Após este longo tempo de convivência, entretanto, a relação foi desfeita.
Ela, então, ajuizou ação de reconhecimento e dissolução de união concubinária com pedido de partilha de bens e alimentos e/ou indenização por serviços prestados. O juÃzo de 1º grau julgou o pleito parcialmente procedente, condenando o réu a pagar alimentos no valor equivalente a 2,5 salários mÃnimos mensais.
Ambas as partes recorreram e o TJ/RS deu parcial provimento ao recurso da autora e desproveu o recurso do réu, afastando a alegação de inexistência da dependência econômica por considerar que ela não podia, aos 73 anos de idade, ficar totalmente desamparada.
“Se o réu optou por sustentá-la, desde quando ainda era jovem, bonita e saudável, muito mais o deve agora, quando surgem os problemas de saúde em decorrência da idade avançada, sendo impossÃvel o ingresso no mercado de trabalho”.
Dignidade e solidariedade humanas
No STJ, o recorrente alegou que houve contrariedade aos arts. 1.694 e 1.695 do CC, visto que os referidos dispositivos só fazem menção ao direito alimentar entre parentes, cônjuges ou companheiros, não dispondo sobre eventual dever de prestar alimentos a concubinas.
Em seu voto, o ministro relator destacou que o direito alimentar é muito mais amplo do que se supôs, exigindo cautela por parte do julgador, que deve encontrar o ponto exato de equilÃbrio seja para fixar, seja para afastar o dever de alimentar ou o de prover o sustento de determinada pessoa.
Nesta esteira, a regra contida nos dispositivos citados, segundo Noronha, foi estabelecida com o escopo de dar máxima efetividade ao princÃpio da preservação da famÃlia. Ocorre que, frente à s peculiaridades, que tornam o caso excepcionalÃssimo, o ministro verificou a inexistência de risco à desestruturação da famÃlia do recorrente.
“Ficou evidenciada, com o decurso do tempo, a inexistência de risco à desestruturação da famÃlia do recorrente, bem como a possibilidade de exposição de pessoa já idosa a desamparo financeiro, tendo em vista que foi o próprio recorrente quem proveu o sustento, o que vale dizer, foi ele quem deu ensejo a essa situação e não pode, agora, beneficiar-se dos próprios atos.”