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Jovem quer ter sobrenomes do pai e do padrasto no registro
Ela quer assinar legalmente o sobrenome dos dois

Um pedido especial  pode gerar decisão inédita na Justiça da Bahia: a permissão para que uma jovem passe a ter na certidão de nascimento o nome do pai biológico e do padrasto.

O pedido de reconhecimento de multiparentalidade foi solicitado pela  própria jovem, Lara de Freitas Moreira, a mãe, Yara de Freitas Moreira, e o padrasto, Eduardo Dantas Bastos, em março.

No dia 20 de agosto, a juíza da 14° Vara de Família, Sucessões, Órfãos, Interditos e Ausentes de Salvador, Maria das Graças Guerra, assinou sentença, considerando o vínculo familiar entre Lara e Eduardo, autorizando a adoção da jovem pelo padrasto.

No entanto, o que a  estudante de medicina de 22 anos deseja, na realidade, é poder assinar legalmente o sobrenome dos dois “pais”, sem que haja uma substituição da paternidade no documento de registro civil dela.

Antes mesmo de Lara de Freitas completar 1 ano de nascimento, a mãe dela e o pai biológico oficializaram o divórcio. Após isso, ele não mais participou do desenvolvimento da filha. Dois anos depois, Yara passou a viver em união estável com Eduardo, que assumiu as funções paternas da menina.

“Durante toda a vida encontrei meu pai biológico apenas seis vezes. Em 2011, ele faleceu e não tive mais nenhum contato com a família dele”, lembra Lara.

Mesmo convivendo tão pouco com o pai, Lara quer manter o sobrenome dele no registro. “Não posso retirá-lo da história da minha vida. Ele sempre será meu pai. Mas também estou querendo poder homenagear o homem que me criou”, diz a estudante de medicina.

Convívio

Lara teve a ideia de incluir o nome do padrasto no registro há um ano, ao conversar com uma amiga que cursava direito. Em conversa informal, ela soube que era possível entrar com um pedido judicial para retificação do registro. Dias depois, procurou um advogado para orientá-la.

Ao saber da decisão da enteada, o contador Eduardo Dantas Bastos, 68, não conseguiu segurar a emoção. “Fiquei feliz da vida, foi uma surpresa para mim. Eu não sabia que esse era o desejo dela. Ela tem todo o meu apoio, pois sempre foi muito querida pela minha família”, diz ele.

A emoção também contagiou a mãe, Yara: “Fiquei radiante em perceber que minha filha reconhece o pai maravilhoso que Eduardo sempre foi para ela. Ele nunca deixou faltar nada,  financeiramente nem em matéria de amor e dedicação”.

Para a estudante, uma setença favorável ao pedido vai apenas confirmar o que vive no dia a dia desde criança. “Quando penso na figura de um pai, é o Eduardo que me vem à cabeça”.

E os laços afetivos que unem Lara e Eduardo vão além do seio familiar. Muitos amigos e conhecidos da jovem sequer desconfiam que ele não é o pai biológico dela. “Muitas pessoas acham que nos parecemos fisicamente”, diverte-se.

Recurso no TJ-BA

De acordo com a advogada Andressa Cardoso, que assina a ação declaratória de parentesco socioafetivo de Lara de Freitas, embora a sentença tenha sido expedida, julgando improcedente o pedido da manutenção do nome do pai biológico, um recurso será interposto no Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA).

A ideia é solicitar a manutenção do nome do pai biológico de Lara no registro de nascimento.

“Ao decidir dessa forma, a magistrada  terminou por negar a existência da multiparentalidade, que é, como visto, justamente a possibilidade de uma mesma pessoa ter mais de um pai e/ou mais de um mãe, sendo um deles biológico e o outro afetivo”, defende a advogada de Lara.

Segundo Andressa Cardoso, este caso é o primeiro que se tem notícia na Justiça baiana em relação à multiparentalidade. De acordo com a advogada, há notícias de situações semelhantes – e isoladas – nos estados de  São Paulo, Rondônia e Acre.

Em todos os casos analisados, de acordo com  a profissional, foi reconhecido que pessoas que possuem, simultaneamente, pais ou mães biossocioafetivos podem incluir o nome destes nos registros de nascimento, sem que seja necessária a exclusão do nome de pais biológicos.

“Trata-se de um tema que, há algum tempo, vem sendo tratado pela doutrina jurídica especializada, mas em torno do qual ainda não foi construída jurisprudência”, explica a advogada.

Comprovação

Para conseguir comprovar o vínculo familiar com o padrasto Eduardo Bastos, Lara precisou reunir fotografias, trabalhos escolares, cartinhas e presentes que oferecia a ele, que foram anexados à ação.

“Ele guardava todas as lembranças da escola do Dia dos Pais. Além de  fotos e de outras provas de que esteve presente em momentos importantes, como quando passei no vestibular”, revela a jovem.

Fonte: A Tarde
Foto: Fernando Amorim