Questionados se é possível, com base na Lei 11.441, que o divórcio seja feito em cartórios quando há filhos da relação, especialistas defendem que sim, no entanto com algumas ressalvas.
Para Rodrigo da Cunha Pereira, professor e presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), em entrevista ao Justificando, o divórcio em cartório depende da idade dos filhos – “De acordo com a lei, é possível sim, desde que os filhos sejam maiores ou capazes. Se forem menores, incapazes ou quando há conflito de interesses, deve ser apreciado no Poder Judiciário. Quando envolve menores e incapazes, as questões relativas a eles deverão ser solucionadas no Judiciário, pois deve haver intervenção do Ministério Público”
No entanto, para ele, a situação deveria ser revista: “Entendo, entretanto, que o divórcio, mesmo com filhos menores ou incapazes, poderia ser feito no cartório, se tais questões já estiverem sido solucionadas no Judiciário. A liberdade estabelecida com a Lei 11.441/2007 de se fazer o divórcio em cartório é um facilitador na vida das pessoas e pode ajudar a desafogar o excessivo volume de processos no Judiciário. Maior liberdade pressupõe também maior e mais responsabilidade com a própria autonomia privada”.
Já Rolf Madaleno, professor e autor de livros em Direito de Família, enfatiza: é possível promover o divórcio por escritura pública mesmo quando existam filhos menores, desde que os direitos relativos aos filhos menores já tenham sido objeto de acerto precedente em processo judicial. Contudo, se os filhos forem maiores e capazes os direitos deles (alimentos) podem ser ajustados na escritura pública de divórcio, desde que eles participem ativamente do ato, assinando e constando da escritura.
Quanto à pensão alimentícia, para ser estipulada em cartório Cunha Pereira ressalva – É possível quando a pensão alimentícia beneficia apenas cônjuges e companheiros, sem filhos. É admissível, portanto, por consenso das partes, escritura pública de retificação das cláusulas de obrigações alimentares ajustadas no divórcio consensual, conforme prevê a Resolução 35 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Quando há filhos menores vai para o Poder Judiciário, ainda que de forma consensual.
Decisão de Tribunal acompanha doutrina
Divórcio realizado em cartório pode fixar pensão alimentícia e, inclusive, resultar em ação de execução de prisão em caso de descumprimento. A decisão – um entendimento recente da Lei 11.441/07 – é da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), que seguiu, à unanimidade, o voto da relatora, desembargadora Beatriz Figueiredo Franco.
No entendimento dela, “a escritura (realizada no cartório) não pode receber menor valoração que a homologação judicial, de molde a tornar impossível a execução da pensão alimentícia”. Com a legislação em vigor, divórcios consensuais, sem filhos menores, podem ser realizados em cartórios. Recentemente, o Poder Judiciário tem entendido, também, que nesse momento é possível fixar pensão, acordada entre ambos, numa maneira até mesmo de desafogar a Justiça.
Consta dos autos que um casal se divorciou no cartório em 20 de agosto de 2010, tendo fixado pensão alimentícia no valor de R$ 1 mil. Dois anos depois, não tendo quitado três meses da pensão, a ex-esposa protocolou ação de execução, isto é, um pedido judicial para que o ex-marido pagasse os débitos sob pena de ser preso.
Contudo, o homem alegou que o pedido de execução seria nulo, já que a separação foi pactuada em escritura pública e não em sentença. Ele também argumentou que o advogado que os assistiu, no momento do divórcio, foi o ex-cunhado, motivo pelo qual pediu a anulação do feito.
No voto, a desembargadora avaliou que não há como aceitar tais argumentos “porque durante dois anos o acordo firmado em cartório mostrou-se adequado à pretensão de ambas as partes e, somente após decorrido tempo razoável é que foram levantadas suspeitas com relação à validade pelo homem”.
Sobre a possibilidade de execução em divórcios realizados em cartórios, a magistrada entende que é necessária para fazer valer o acordo. “Em verdade, as pessoas costumam pagar pensão alimentícia por temor de serem presas e, se esvaziada a possibilidade de decreto de prisão por ser o título extrajudicial (em cartório), o temor desaparecerá, desestimulando o pagamento do valor devido”.
Fonte: Justificando