O Secretário da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, Flávio Crocce Caetano, proferiu palestra durante o Congresso Nacional do Registro Civil 2014 (Conarci), realizado no Rio de Janeiro, para aproximadamente 200 registradores, sobre a possibilidade da prática de mediação nas serventias extrajudiciais.
De acordo com Crocce, a cultura jurídica do Brasil é a cultura do litígio. E esta cultura fez com que a carga de processos judiciais do país chegasse, atualmente, a 92 milhões de ações.
“Temos que trazer para o Brasil a cultura do consenso, a cultura da mediação. É algo que existe no mundo todo. Nos Estados Unidos já se faz a mediação há mais de trinta anos, Europa faz também há mais de 20 anos, e muito mais perto da gente, a Argentina faz, e faz bem, há mais de 17 anos. Mas alguém pode dizer que no Brasil nós temos arbitragem, conciliação, mas nós não temos mediação. Nós não temos, ainda, uma lei que trate de mediação”, iniciou Caetano.
Foi com este pensamento que a Secretaria de Reforma do Judiciário começou a trabalhar com o incentivo a formas alternativas de soluções de conflitos, e entre elas a mediação.
“Não podemos fugir da realidade. Nós temos conflitos, temos litígio, e há casos sim que é o juiz quem deve resolver. O juiz é um terceiro que vem para resolver aquele conflito, mas há também outras formas de solução de conflitos que são formas alternativas à justiça, como é o caso da arbitragem, da conciliação, da mediação e da negociação”, declarou o secretário.
De acordo com Flávio Crocce Caetano, existem diferenças essenciais entre a arbitragem, a conciliação e a mediação. A arbitragem existe no Brasil há mais de 15 anos. Nela, as partes escolhem um terceiro, que é imparcial e tecnicamente capaz, para resolver o conflito. As partes o contratam de comum acordo, mas é ele quem decide. Ele confere uma sentença arbitrária. A conciliação também é feita por um terceiro, escolhido pelas partes, mas o conciliador aponta soluções. Ele aponta vantagens e desvantagens e aconselha. Já na mediação, um terceiro imparcial, escolhido pelas partes, vai promover o diálogo, vai entender o sentimento das partes e ajudar a construir o consenso. Vai colaborar para que as partes cheguem por elas mesmas ao consenso. Ele não vai dar a solução.
Para o secretario, a prática da mediação no país facilitaria o acesso à justiça pela população. “Onde se aplica a mediação, em outras partes do mundo, as taxas de êxito são de 80% em causas cíveis e 90% em causas de família. Se a gente conseguir aplicar isto no Brasil, e der certo, há três grandes benefícios. Primeiro, as partes ficarão satisfeitas, porque elas chegarão a um acordo, não será um terceiro a decidir. Segundo, se resolverá o conflito com muito mais rapidez, e terceiro, será muito mais barato”, explicou.
No entanto, para que isso vire realidade, é necessário que exista um marco legal. É preciso que haja uma lei que trate expressamente da mediação no país. Por este motivo, o Ministério da Justiça já apresentou um projeto de lei com mais de 40 artigos que trata da mediação ao Congresso Nacional. A intenção do Ministério da Justiça é pulverizar os centros de mediação fora da justiça, inclusive nas serventias extrajudiciais.
“No projeto demos passos importantíssimos. Na justiça, em casos que couberem mediação, ela será a primeira etapa obrigatoriamente, com prazo máximo para se resolver a mediação em 90 dias. Neste projeto de lei nós apoiamos todas as formas de mediação, e ali colocamos textualmente nosso apoio à mediação realizada nas serventias extrajudiciais. Vocês trouxeram pra nós os projetos de desjudicialização do divórcio e do inventário, o que mudou a realidade do povo brasileiro e trouxe muita facilidade para a população. Para nós agora a fase é da mediação. Quanto mais capilaridade melhor, e ninguém está mais perto da população do que vocês,” declarou ele.
O projeto de lei que prevê a mediação nas serventias extrajudiciais já está em fase adiantada de tramitação. Ele foi aprovado no Senado e está em tramitação na Câmara dos Deputados. O relator é o deputado Alex Canziane.
“Estamos muito otimistas em aprovar este projeto de lei neste primeiro semestre ainda, para que possamos no final do ano implantar a mediação em todo o Brasil, para melhorar a justiça no nosso país”, completou o palestrante.
O Ministério da Justiça tem ainda outras ações voltadas para incentivar a mudança cultural de litígio no país. Foi criada uma escola de mediação, com cursos de capacitação presenciais e a distância, que fará parceria com a Anoreg Brasil e Arpen Brasil para a capacitação dos registradores e notários no futuro. Além da escola, o Ministério da Justiça quer levar a mediação como disciplina para os cursos de direito, e exigir também que este conteúdo faça parte do exame de ordem e dos concursos públicos.
O Ministério apoia ainda uma iniciativa chamada justiça comunitária. “Apoiamos a mediação feita por agentes comunitários. Nós capacitamos pessoas do povo que vão fazer a mediação lá na ponta, porque só se inclui socialmente as pessoas quando elas conhecem seu direito e podem resolver seus conflitos. Este projeto é algo que foi muito bem feito na Colômbia. Nós do poder publico temos que fazer algo para chegar na ponta. Cerca de 80% dos homicídios do Brasil ocorrem por motivos fúteis, ou seja, aquela discussão com o vizinho, aquela briga em casa, no trânsito. Se você faz a mediação na comunidade, você resolve o problema, você evita a violência. Este é um projeto que nós do Ministério da Justiça temos levado adiante, é o nosso carro chefe e vamos levar a todos os lugares que podemos levar”, disse Caetano.
Fonte: Recivil