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Não existe cartório “grátis”
Artigo de Angelo Volpi Neto

*Artigo de Angelo Volpi Neto

E “viva” o horário gratuito eleitoral, onde o Brasil se torna perfeito. Tudo será lindo e maravilhoso e “grátis”. A propósito, uma das frases mais propagadas e popularizada sobre economia é de que “não existe almoço grátis”. Se o estudante e o idoso pagam “meia” entrada é porque todos estão pagando a conta. E por óbvio também não existe serviço de cartório “grátis”, nem atendimento na Santa Casa, na defensoria pública, no judiciário e sabe-se lá o que mais os usuários de serviços notariais e registrais pagam.

O chamado subsídio cruzado – quando alguém paga um serviço que ele mesmo usa ou pior ainda que nunca usará – virou uma prática amplamente disseminada e tida como “politicamente correta”. Quer se eleger ou manter-se no poder? Prometa oferecer uma gratuidade qualquer de preferência aos que também não precisam dela, pois afinal voto é voto!

Com o subsídio cruzado o poder público – leia-se políticos – procura além de angariar popularidade e “votos” para reeleição, beneficiar uma classe de consumidores mais carente. Assim, o consumidor que paga o subsídio tende a reclamar do preço do produto e não do governo. Sentimos isso “na pele” todo dia em nossos tabelionatos, onde o cliente inclui até o imposto de transmissão na “conta do cartório.”

Mas afinal o que é justo, recomendável e aceitável em subsídios cruzados? Em primeiro lugar é preciso reconhecer que se o sistema tributário fosse mais eficiente neste sentido, certamente não haveria necessidade deste tipo de compensação entre nós. Bastaria o governo subsidiar os carentes com a receita dos impostos e assim promover justiça socioeconômica. Não o fazendo se obriga a criar esse malfadado subterfúgio que cria uma enorme distorção do preço de serviços e produtos.

Olhando para os casos mais comuns podemos vislumbrar as distorções geradas pelos referidos subsídios. Aquele que não paga a tarifa de transporte público (idoso) é incentivado a usar mais (por ser isento do pagamento) enquanto o que paga é incentivado a fazer menos viagens. Temos aí portanto no mínimo dois problemas, o primeiro é que a gratuidade está gerando uso desnecessário inflado pela gratuidade e a segunda que, tanto o idoso carente quanto que não precisa da gratuidade são beneficiados. Tudo isso sem falar do custo de administração (cadastros, selos, fiscalização, etc.) e da rara transparência dos sistemas arrecadatórios e de pagamento.

Os subsídios cruzados encontram-se em muitos serviços públicos tais como água e luz, a chamada “justiça distributiva” pelo pagamento de determinados serviços em favorecimento de outros espalha-se como praga em nosso país. E como não poderia deixar de ser os serviços notariais e de registro vêm sendo fustigados, sendo comum inclusive que os “fundos” e “ressarcimentos” tenham seu preço mais alto que os próprios emolumentos. Nestes casos, temos ainda o agravante que o pagante não é necessariamente beneficiado ou usuário de serviço que lhe é cobrado, caso típico dos fundos ao judiciário que só beneficiam a quem dele se socorre, portanto sem atender o princípio vinculativo previsto no art. 77 do Código Tributário.

Mas a maior contradição é que os serviços notariais e registrais tem como principal escopo evitar a lide prevenindo o conflito e portanto o judiciário. Pois, são serviços delegados do poder público, cuja finalidade é o desenvolvimento espontâneo e eficaz da sociedade para realização voluntária do direito.

Mas os subsídios sobre os emolumentos não limitam-se ao judiciário, e sabe-se lá desde quando começaram a pipocar nas irracionais, injustas e desiguais legislações estaduais de emolumentos por este país, onde encontramos desde a Santa Casa de Misericórdia até associações classistas. Ressalte-se que o presente não tem a finalidade de questionar os motivos e as razões, sejam morais, sociais e políticas dos referidos subsídios. Mas apenas e tão somente, provocar uma reflexão sob o aspecto estritamente legal.

Fonte: Colégio Notarial do Brasil