O Tribunal de Justiça do Estado (TJES) está gestando uma proposta que deve mudar a forma de distribuição dos cartórios extrajudiciais em todo Espírito Santo. Foi aberta na última segunda-feira (20) uma consulta pública ao anteprojeto de lei complementar, que pretende reduzir o número de unidades de 360 para 243, caso a matéria seja aprovada. Sob pretexto de melhora na oferta dos serviços, o tribunal sugere uma redução significativa no número de cartórios nos municípios de pequeno porte. Por outro lado, amplia o total de unidades na Grande Vitória e nas cidades-polo do Estado, que registram uma maior movimentação financeira.
Pelo atual modelo, que se baseia em uma legislação com 30 anos de vigência, os municípios considerados pequenos – que representam 66 dos 78 municípios capixabas, de acordo com os critérios de avaliação do IBGE – respondem por 252 unidades ao todo. Caso o projeto seja aprovado, o número de unidades previstas em lei cai para 103, uma redução de quase 60%. Já nos municípios maiores, o número de cartórios deve saltar de 108 para 140, uma alta de 28%. Contudo, somente entre os quatro municípios da Grande Vitória a previsão é de que o total de unidades deva até triplicar.
Segundo o texto, o total de cartórios em Vitória deve saltar de 13 para 25; em Cariacica, de quatro para 11; Vila Velha, de nove para 22; e na Serra, que deverá ganhar o maior número de unidades, subirá dos seis atuais para 22 cartórios. Já entre as cidades-polo, o município de Cachoeiro de Itapemirim deve perder o maior número de cartórios, de vinte pare apenas nove com a mudança. No interior do Estado, também chama atenção a situação de Alfredo Chaves que deve perder sete unidades, ficando com apenas dois cartórios logo após a reorganização.
No caso dos municípios pequenos, os serviços oferecidos pelos cartórios (registro de pessoas naturais, tabelionato de notas e registro de imóveis) são disponibilizados por todos os cartórios da cidade, divididos normalmente apenas com base em sua localização – sede e distritos. A proposta de mudança altera isso, criando um único cartório de Ofício Geral, atendendo a todo município.
Já nas cidades mais populosos entre aquelas de pequeno porte, os serviços são divididos em cartórios específicos, também respeitando essa divisão territorial. Nas comarcas do interior, a proposta sugere a criação de até três grandes cartórios – um de registro geral, um de tabelionato e outro de ofício. Na Grande Vitória, o anteprojeto garante a ampliação dos cartórios específicos como, por exemplo, a ampliação dos cartórios de tabelionato em Vitória – que hoje são quatro – para dez divididos entre todos os bairros da Capital.
Na justificativa da proposta, o presidente do TJES, desembargador Sérgio Bizzotto, aponta a existência de um excesso de demanda nos municípios maiores, e uma escassez da oferta dos serviços nos municípios de pequeno porte, fato que estaria causando problemas entre os próprios tabeliães. “[O atual modelo] tem perpetuado distorções das mais diversas ordens, notadamente, quanto à desproporcional, crescente e injustificável concentração de rendimentos por um reduzido segmento da categoria”, explicou.
Segundo Bizzotto, os donos de cartórios na Grande Vitória faturaram até 60 vezes acima do teto constitucional, que é o salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). No ano de 2014, os titulares do Cartório do Registro Geral de Imóveis da 3ª Zona de Vitória recebeu R$ 856 mil em média por mês, enquanto os líderes alcançaram ganhos milionários a cada 30 dias – os donos do Cartório do 1º Ofício da 1ª Zona de Vila Velha (R$ 1,64 milhão) e do Cartório do 1º Ofício da 2ª Zona de Serra (R$ 1,78 milhão).
“Em outras palavras, o modelo de organização vigente trata de assegurar que apenas um terço da categoria dos notários e oficiais registradores tenha acesso ao mercado formado por 68,6% da população e 71,2% do PIB do Estado. Enquanto isto, o restante da categoria, ou o contingente majoritário de 67% vê-se forçado a competir em mercado diverso, limitado a 31,4% da população e apenas 28,8% do PIB”, sustenta.
Para ele, o atual modelo é “absolutamente defasado, que só vem criando distorções das mais diversas ordens, inclusive, de natureza econômica e financeira entre os membros da própria categoria”. Outro problema é o alto índice de vacâncias verificado nas comarcas menores situadas no interior do Estado – atualmente, o número de serventias sem tabelião titular é de 184, porém, apenas 56 poderiam ser distribuídas imediatamente por concurso público, conforme dados da Corregedoria Geral de Justiça capixaba.
“O alto índice de vacâncias observado no interior do Estado tem acarretado um vultoso encargo para o Poder Judiciário, que não dispõe de orçamento para custear com tamanha frequência concursos públicos deste porte. Por exemplo, a execução do concurso público de provas e títulos em andamento teve como valor inicial R$ 1,13 milhão”, justificou o presidente do TJES.
A proposta ainda prevê as condições para transferência dos novos cartórios: os atuais titulares terão preferência na ocupação das unidades recém-criadas e, em alguns casos, o direito de optar pela zona de atuação da sua preferência. O restante deve ser oferecido por meio de concurso público, como prevê a Constituição Federal.
A íntegra do anteprojeto e os seus anexos estão disponíveis para consulta pública em link na página principal do site do TJES ou no endereço aqui. As pessoas interessadas em participar do debate sobre o tema poderão se manifestar até o dia 5 de agosto por meio do correio eletrônico [email protected].